200
mts
Para percorrer duzentos
metros, são necessários mais ou menos quatrocentos passos, sem pressa; ou
duzentos passos bem apressados. Demora alguns segundos para quem está em um
carro, e uma quantidade variável de minutos para quem está á pé.
Um homem foi atropelado a
duzentos metros de uma passarela. Em data recente um homem foi atropelado em
uma via expressa de Natal/RN. A principal via que dá acesso, e que atravessa a
cidade. Teve morte instantânea ao ser atingido por um carro em alta velocidade.
É uma via de velocidade, sem o respeito necessário a quem precisa atravessa-la a
pé.
E o noticiário enfatizou que
o cidadão falecido, estava apenas a duzentos metros de uma passarela. Mas o quanto
significam duzentos metros? Quanto significa duzentos metros para um pedestre,
e quanto significa duzentos metros para alguém em um carro com velocidade?
Quanto tempo será necessário para um carro percorrer duzentos metros? E quanto
tempo é necessário para um pedestre caminhar duzentos metros? O quanto de
pressa tem quem passa de carro e quem anda a pé? Quais seriam os destinos de
cada um, estando a pé ou de carro? E os dois precisavam passar pelo mesmo
lugar, o mesmo ponto fatídico. A infeliz coincidência de cruzarem um mesmo
ponto, em um mesmo momento.
Em redes sociais surgiram
opiniões de que fora um ato suicida do pedestre. Não fica claro se a postagem
afirma ter sido uma tentativa de suicídio, bem sucedida; ou uma critica ao
pedestre em tentar atravessar a pista naquele local. O pedestre agora não esta
presente para dar sua versão. Cada qual agora busca dar razão ao motorista,
inclusive citando que seus familiares ─ do falecido ─ deveriam custear os danos
causados ao carro.
Criticas ao cidadão falecido
foram postadas na pagina da rede social da Universidade Federal. Pelos mesmos
alunos que brigam e reclamam dos valores cobrados pelas passagens; e por
melhores condições nos transportes públicos. Os mesmos alunos que diariamente
se espremem dentro de um ônibus circular que percorre o campus sem cobrar a
passagem (leia-se tarifa). Duas linhas em sentidos inversos e contrários cobrem
o campus sem a necessidade de o aluno atravessar as pistas para pegar o ônibus,
de outro lado da pista, dentro do campus. Indo ou vindo entre suas necessidades
de deslocamento dentro do campus universitário.
No local próximo do acidente
realmente havia uma passarela, que dizem estar a duzentos metros de distancia.
No local do acidente seguindo em uma das direções existe uma passarela que pode,
e poderia ser alcançada pelo transeunte. Na outra direção existe outra bem mais
distante para ser alcançada. Para atravessar a pista o cidadão deveria seguir
em direção a uma passarela, mas só uma poderia ser avistada daquele ponto, onde
tentou atravessar. Bastaria que ele seguisse em direção à passarela avistada,
com muitas pessoas disputando uma estreita calçada. E ainda caberia uma
vistoria, ou uma perícia para saber se realmente a passarela pode ser avistada,
considerando que a vitima não conhecesse a cidade. Daí surge algumas duvidas: a
vítima sabia da existência de uma passarela? Foi possível avistar a passarela?
Há indicativos de haver uma passarela? Há uma diferença de planos entre o local
da passarela e o local do acidente. E até aqui não há informações da altura da
vitima, e da sua procedência, origem e destino. Somente com uma pericia in loco pode-se afirmar, alguns
resultados. Quem passa por ali todos os dias conhece a passarela.
Alguns minutos seriam necessários
para chegar à passarela, seguindo e subindo um leve aclive da pista naquele
local. Depois de chegar à passarela, ainda alguns lances de aclives a serem
escalados, na citada passarela, para alcançar o plano que cruza sobre as pistas
de rolamento. E então caminhar até o ponto desejado, do outro lado, que
poderiam então talvez somar quatrocentos metros. Outra caminhada, para chegar
ao mesmo ponto onde tentou atravessar.
E em poucos segundos um
carro passou pela passarela, e chegou ao ponto do sinistro. Uma coincidência
fatal de um carro que percorreu dezenas de metros e um homem que andou alguns
metros. Não quis andar as centenas de metros, para contornar, preferiu alguns
passos à frente. E seus caminhos se encontraram no meio da pista. A disputa
entre o homem e a máquina, o encontro entre duas pessoas, em situações e
condições diferentes.
Não se sabe até aqui as
condições físicas ou psíquicas da vítima. Distancias podem ser relativas para
uns e para outros; quer sejam dezenas ou centenas de metros, para jovens ou
idosos, para pedestres ou veículos. Pessoas com dificuldades ou deficiências de
locomoção e pessoas com uma capacidade normal de visão, de audição, e de locomoção.
Distancias e acessibilidades são relativas para engenheiros de transito, dentro
de um escritório. Acreditam que a cidade funcione matematicamente de acordo com
seus cálculos, ou para quem circula pelas ruas, e vive o dia a dia de uma
cidade, entre ruas e calçadas.
Uma estreita calçada é o
caminho até uma passarela, a citada passarela. Uma calçada cheia de buracos, desnivelada,
com vendedores ambulantes, inclusive com mesas e cadeiras na calçada,
churrasqueiras, geladeiras e fritadeiras. E dezenas de pedestres desnorteados, e
desorientados em pontos e paradas de inúmeros ônibus coletivos que passam e
param por ali. Cada qual não quer perder seu ônibus e fica, para lá e para cá,
tentando saber onde o ônibus vai parar. E ainda há uma pista para atravessar,
uma pista na esquina de um grande shopping, sem semáforo. Atravessa-se na
esperança que os carros respeitem uma faixa de pedestre, ao dobrar à direita, e
dos carros que vem em sentido contrario, para então dobrar a direita.
Uma estação de transferência
climatizada e conectada, nova e envidraçada, aguardando ser inaugurada. Com acessos
à internet embeleza a paisagem. Impede a passagem para chegar a uma passarela,
dificulta a passagem pela calçada. E a citada passarela esta apenas a duzentos
metros. Uma maratona de duzentos metros com obstáculos. Dentro da estação
vazia, fiscais municipais desfrutam do ar condicionado, e dos assentos
disponíveis. Talvez estejam colocando suas redes sociais em dia, ou passando a
limpo as multas anotadas. Não há placas indicativas sobre a calçada, que possam
orientar, onde cada linha de ônibus pode parar. Entende-se que há paradas de
ônibus pela aglomeração de pessoas à beira da estrada. Ônibus municipais e
intermunicipais fazem ali as suas paradas.
Dezenas de carros com uma ocupação
solitária cruzam a avenida naquele ponto em um intenso vai e vem. E um homem
solitário tentou atravessar a avenida. Seu óbito não aconteceu por não ter ido
de encontro a uma passarela, mas por não haver uma passarela naquele ponto que
tantos precisam atravessar.
Todos os dias os telejornais
mostram o quanto o transito pode afetar os motoristas solitários. E os
motoristas solitários se mostram solidários reclamando de semáforos, das rotatórias,
de suas vidas com ônibus e transportes alternativos que atrapalham seus
caminhos. E das calçadas de pedestres que eles insistem em querer e poder estacionar.
10/03/15
Entre Natal/RN e Parnamirim/RN
Texto disponível em:
Roberto
Cardoso
IHGRN/INRG
Desenvolvedor de Komunikologia
Komunikologie
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